Também conhecido como Mysteriae Pragensis, o Museu de Fantasmas e Lendas de Praga tenta emular a atmosfera da cidade conforme ela era na Idade Média e, por isso, ele conta com dois andares, sendo um subterrâneo. Quando eu entrei, já assombrada pelos xingos e reclamações da minha mãe, as mocinhas que trabalhavam na recepção me disseram que o subsolo era interativo, então eu fiquei no maior medo que fosse estilo Playcenter, sabe? Que tem uns nego que pulam pra te assustar HAHAHAH... então fiquei prestando bem a atenção e também tive que tirar as fotos na maior correria.. por isso tem várias que estão meio tremidas, por causa da pressa e da baixa luminosidade :( desculpa, gente...



Vou narrar rapidamente algumas das legendas expostas na parte subterrânea do museu, a começar pelo Cavaleiro Sem Cabeça:

No labirinto mágico da parte velha da cidade de Praga, havia um elegante cavaleiro templário que andava num gracioso e nobre cavalo branco. Atualmente este grande cavaleiro é um dos mais adorados fantasmas de Praga, apesar de ele não ter cabeça. O Cavaleiro Sem Cabeça pode ser encontrado segurando sua cabeça nas mãos enquanto cavalga pelas ruas de paralelepipedos em seu cavalo, sempre desafiando os corações mais corajosos a libertá-lo de sua servidão fantasmagórica. Para tal, uma pessoa viva deve ser forte e corajosa o bastante para prender seu cavalo, roubar-lhe a espada e cravar-lhe no coração do fantasma. O Cavaleiro Sem Cabeça pode ser encontrado (se você acreditar nele) vagando na pitoresca e assustadora rua de Liliova entre a meia noite e a uma da manhã. Não é certo se o Cavaleiro Templário é culpado por algum crime cometido em vida ou por que ele recebeu tão terrível destino, mas uma coisa é verdade, ele é um dos mais elegantes fantasmas que Praga tem a oferecer.

A Freira Assassinada

Se você estiver andando pelos arredores do Convento de Santa Agnes, em Josefov, durante as horas escuras da noite mágica, procure pela Freira Assassinada! Ela parece ser bem inconstante, uma noite ela pode estar coberta de sangue e chorando amargamente e em outra ela pode estar sorrindo carinhosamente para apaixonados infelizes. Filha de um homem rico e nobre, ela tragicamente se apaixonou por alguém que não era de sua classe: um pobre cavaleiro. Seu nobre pai, obviamente, recusou dar seu consentimento à união e como punição ao seu imperdoável pecado, o pai enviou a filha para viver no convento de Santa Agnes, na qual ela ainda vive atualmente, mas apenas em forma transparente. A noite anterior à qual ela foi transferida para o convento, ela decidiu seguir seu coração e se encontrou com seu amado, mas ela acabou se deparando com seu pai que, disfarçado, esfaqueou-a por envergonhá-lo. A Freira Assassinada tem assombrado a área de Santa Agnes desde então, mas não tenha medo, porque ela não deve ser temida! Sabe-se que o fantasma aparece apenas às garotas que desejam envenenar a si mesmas por causa de um infeliz e pobre romance. A Freira Assassinada agarra o veneno das mãos da garota deprimida e põe um saco de moedas no lugar, permitindo-a viver uma vida feliz e próspera com seu verdadeiro amor. Ah se Praga tivesse mais fantasmas como a Freira Assassinada!


E depois de procurar um tanto e subir mais umas ladeiras, encontrei num lugarzinho escondido o tal museu dos alquimistas, que tem como uma das principais atrações essa saleta específica para o mito do Fausto:


Bom, existem vários lugares em Praga que estão conectados a várias lendas e mistérios, como vocês já perceberam ao ler o post. Mas existe uma casa na praça de Carlos, a qual eles chamam de Casa do Fausto, que tem uma lenda que diz que o Doutor Fausto morou ali e que foi naquele lugar que o Diabo o levou para o inferno a partir de um buraco aberto no teto. Outra lenda ainda conta que um pobre estudante morava nessa mesma casa. Ele, que estudava magia negra, acabou desaparecendo sem deixar nenhum vestígio. Mas, apesar dessas lendas, o que se sabe com certeza é que vários alquimistas moraram nessa casa e, durante seus experimentos, eles acreditavam estar conectados ao Diabo e, por isso, entendia-se que a casa estava amaldiçoada.


Nessa primeira parte do museu, vemos primeiro as informações básicas da alquimia, para então entrarmos na sala do Fausto e podermos ler sobre a lenda deste e sobre demais alquimistas e feiticeiros da antiga Praga. E aí vamos descobrir mais conexões entre essa figura mítica e a capital tcheca. Na verdade, existe um livro chamado Opus Magnum. The Book of Sacred Geometry, Alchemy, Magic, Astrology, the Kaballa, and Secret Societies in Bohemia que foi publicado em Praga em 1997 e que é dedicado a assuntos esotéricos. Escrita por D.Ž. Bor, a obra mostra como a lenda de Fausto está conectada com a cidade de Praga. O texto menciona uma tradição que diz que o livro usado por Fausto para conjurar espíritos foi pela primeira vez publicado em Praga em 1509, mas isso se trataria de uma lenda que, no entanto, chegou a tentar ser fundamentada por vários livros e manuscritos, como é o caso de títulos como Dr. Faustus grosser und gewaltiger Höllenzwang. Esse livro, que narra "a amaldiçoada e merecida morte" do Doutor Fausto ainda inclui a visita deste a Praga:

De Viena, ele foi a Praga, a principal cidade da Boêmia, e que é dividida em três partes, as quais são a antiga Praga, a nova Praga e a pequena Praga. A Pequena Praga é o lugar onde a Corte Imperial é situada sobre as altas montanhas: há um castelo, onde há duas igrejas, numa das quais ele encontrou um monumento, o qual poderia ter muito bem sido um espelho para si mesmo, e este foi o Sepulcro de um notável conjurador, que com sua magia encantou seu próprio sepulcro para que qualquer um que pisasse sobre ele jamais morreria em sua própria cama. Do castelo ele desceu e foi até a ponte. Essa ponte dia vinte e quatro arcos. No meio da ponte havia um grande monumento, o qual era uma cruz feita de pedra e na maior parte artificialmente esculpida.

Reconheceram a passagem? Ele passou pela Ponte Carlos e viu o monumento da Cruz!

Dali ele foi para a antiga Praga, que é separada da nova Praga por uma grande e profunda vala e abraçada por uma parede de pedras. Até então há a cidade judaica, na qual há treze mil homens, mulheres e crianças, todos judeus. Lá ele viu a escola e o jardim, onde todas as formas de bestas selvagens são mantidas; e dali ele estabeleceu uma rota pelas três partes da cidade, pelas quais ele vagaria de modo a conhecer uma cidade tão poderosa por dentro de seus muros.

Bom, eu fiz uma tradução bem meia-boca, porque eu não entendo muito bem de inglês arcaico hahaha... mas o que dá para entender é que Fausto não só teria visitado Praga como também há histórias que dizem que Fausto, na verdade, teria sido tcheco: que ele teria vindo de uma cidade da Boêmia chamada Kutná Hora e que seu verdadeiro nome teria sido Šťastný que, literalmente, significa "sortudo, feliz", termo que, no fim das contas, é sinônimo do latim Faustus. De acordo com essas histórias, Šťastný foi obrigado a sairda Boêmia durante a revolta hussita nos anos de 1420 e ir para a Alemanha, onde ele começou a assinar seu nome como Faustus. Algumas das façanhas atribuídas a Fausto, conforme conta o livro de Bor, foram previamente associadas ao legendário feiticeiro tcheco Zito, que viveu na corte do rei tcheco Wenceslas IV.


Aí depois tem um outro prédio, no qual você tem que subir 60 degraus (ai minha disfunção femuro-patelar) para chegar a um ambiente que simula os 'laboratórios' onde os alquimistas faziam suas experiências. Bem legal mesmo... tem uns animais empalhados e outros em vidros.






Uma das histórias que eu mais gostei de ler no livrão que tem lá é sobre a Dark Lady, de Shakespeare. Ela foi personagem de sonetos do poeta inglês e é chamada assim por causa de seu cabelo preto e pele escura. Mas bem, não cheguei a fotografar essa parte do livro, então vou deixar a tradução de um trecho do livro Shakespeare, Alchemy and the Creative Imagination. The Sonnets and A Lover's Complaint, de Margaret Healy, que fala justamente dessa personagem a partir de um ponto de vista alquímico ou metafórico:

A Dama Obscura de William
Quem ou o que é a Dama Obscura? Misteriosa mutabilidade é o destaque da escrita alquímica e assim como o "amigo" do narrador dissolve e reaparece em existência material, às vezes parecendo um "ele", às vezes um "ele-ela", às vezes um aspecto da psique do poeta, ocasionalmente lembrando uma "ela", e possivelmente até mesmo Deus, a obscura senhorita desafia nossas inevitáveis tentativas de estabilizá-la. Sugestivamente, no soneto 127 ela é tanto "herdeira de beleza sucessiva" - a filha "bastarda" de um "amável garoto", seu "sucessor" no opus. Uma "astuta", caprichosa tirana apaixonada que também tem aspectos maternais (assim como quando ela é chamada para confortar o choramingante Will no soneto 148), ela é certamente uma complexa e ambivalente criação literária. Mas um de seus mais dominantes - apesar de negligenciados - disfarces é que a Senhora Natureza por si mesma - uma prima literária, para ser específico, do tipo de Ishtar, Medea e Circe descrito acima. Isso não é o suficiente para, no entanto, justificar os materiais que contêm certos aspectos da obscura dama de Shakespeare - "Mary Fitton ou Lucy Negro, Jacqueline Field, Emilia Lanier, ou [mesmo] ... Senhorita Winifred Burbage" - para a natureza do hermetismo o poder interior pode ser despertado pela contemplação da Dama Natureza a partir da beleza do corpo feminino. (p.115)

Referências

Faust in Prague. http://www.spamula.net/blog/2006/08/faust_in_prague.html
Haunted Prague and Czech Legends. http://prague-stay.com/lifestyle/category/176-prague-legends-myths-and-ghosts/177-haunted-prague-and-czech-legends/